quarta-feira, julho 02, 2008

Nameste, Patan!


‘Nameste!’ – cumprimentam-nos dezenas de pessoas à entrada de Patan, local de visita a seguir à Stupa. Chegamos à praça de Patan – a Durban Square - onde nos rodeiam templos hindus e budistas, decorados com esculturas talhadas em madeira e pinturas exóticas representativas dos deuses e animais sagrados. A arquitectura tem como principal matéria de construção a madeira e os edifícios contam já com mais de 500 anos. Alguns deles, parecem frágeis e que a qualquer momento irão desabar, mas lá parecem aguentar-se e vencer o tempo.
Patan é Património da Humanidade e não é difícil perceber o motivo. Laliptur é um outro nome dado a Patan que significa ‘’cidade da beleza’’, e é essa a impressão que fica. A de uma beleza exótica, mas agreste. Não está tudo bem tratado, bonitinho para turista ver. Pelo contrário, está tudo ali em bruto: sejam os edifícios, sejam as gentes. Pessoas humildes, novos e velhos, passeando-se com a lassidão imposta pelo calor abafador. Uma grande parte aproveita e senta-se nas escadas dos templos, em atitude contemplativa ou de quem não tem mais nada para fazer. Outros agacham-se numa estranha forma de se sentar no chão e ali ficam, horas a fio, a ver outros a passar. As faces bronzeadas e curtidas pelo sol revelam-nos as idades das pessoas, porque em termos físicos, novos e velhos quase que nem distinguem. A maioria, de estatura média, corpo esguio e franzino imposto pela refeição racionada à base essencialmente do arroz que produzem. Ao percorrermos as ruas de Patan deparamo-nos com colossais estátuas em pedra. Apercebemo-nos também que a economia da cidade assenta no comércio, turismo, arte e souvenirs e, também na agricultura. Em jeito de piada, o guia comenta que no Nepal existem três religiões: ‘’Hindusm, Budhism and Tourism!’’
E não deixa de ser verdade. Ainda que não sejamos ininterruptamente incomodados com pessoas a quererem vender-nos coisas, o facto é que muitos nos abordaram com variados produtos artesanais. Não era fácil descartar-nos e acabamos por nos render ao encanto de duas meninas com cerca de 7 anos que, todas contentes, levaram umas notinhas e nos deixaram ficar com umas bolsas feitas à mão. Em Patan, aliás como em todos os restantes locais que visitamos, não foi difícil esvaziar as notas da carteira. Não porque andássemos sempre a comprar coisas, mas porque algumas pessoas nos estendiam as mãos como quem pede para poder comer … E com apenas dez cêntimos (!) lá iam todas contentes. Dez cêntimos no Nepal já é dinheiro. Cá é estorvo na carteira, cascalho … A perspectiva sobre riqueza e pobreza altera-se completamente perante esta realidade.
Entre pagodes e palácios, houve ainda tempo para visitar o Templo da Deusa Kumari, a casa da única Deusa viva da religião budista. Kumari é representada como a Deusa da Virgindade e personalizada por uma criança que, desde muito pequena, é fechada literalmente no Templo só tendo direito a duas aparições públicas anuais, durante os festejos em sua honra. Quando a Deusa fica menstruada pela primeira vez, perde o seu título, abandona a Casa e dá lugar a uma outra nova criança endeusada. Assustador é o método de selecção da Deusa: ao que parece, a criança é fechada num quarto escuro no sentido de testar a sua reacção. Se não se assustar, gritar ou tentar fugir, significa que é uma Deusa com o poder de afastar os terríveis espíritos malignos. É difícil manter-nos acríticos perante esta história. Tão ou mais chocante ainda foi passar numa das ruas e deparar-nos com um búfalo decapitado, ainda a estremunhar. Uma cena terrível de se ver e que para os nepaleses representa um momento de solenidade, um sacrifício que serve de oferenda aos deuses.
Regressamos ao carro, carregados de fotografias e de alguma agitação. No momento em que saíamos da Casa da Deusa Kumari, uma velhinha com pouco mais de um metro de altura estende as mãos a pedir-nos dinheiro para comer. Já de carteira vazia, apenas restou-nos dar-lhe uma barra de cereais que trazíamos connosco. De repente, os que a rodeavam desataram a rir e foi um momento de chacota generalizada. Ficamos sem reacção … mas ela safou-se melhor que nós, olhou desolada para barra, desembrulhou-a e comeu-a. Pelo menos, ficou com o estômago mais composto - pensamos.
Seguimos para o Hotel, já dentro do carro, e agora com uma atitude já bem mais descontraída face ao caos do trânsito. Passamos no Palácio do Rei, ou melhor, do ex-Rei que em Maio se mudou voluntariamente do Palácio, obedecendo assim à vontade popular do Nepal se tornar numa República. Ao que nos disseram os guias, a transição do regime estava a ser pacífica e a esperança na melhoria das condições de todos era grande.
Dentro do carro, sussurramos que uma boa ideia era já enviar para o Governo uma petição para colocarem caixotes de lixo na cidade. Por mais simples que esta medida pareça, a realidade é que em Kathmandu não existem caixotes de lixo. As lixeiras amontoam-se ao longo das ruas, de forma intermitente. As vacas e os mosquitos agradecem certamente, mas os nossos narizes contorcem-se de dor!
Regressamos ao Hotel e nessa noite saboreamos a cozinha indiana. Um misto de carne de porco e de galinha, misturado com molhos com caril e arroz branco. Delicioso!
Era tempo de fazer a mala e reunir o essencial. Para já Kathmandu e os seus segredos ainda por revelar ficariam para trás. No dia seguinte, partíriamos bem cedo rumo a Chitwa

n, rumo à selva.


Na foto: Patan (Durbar Square)

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