sexta-feira, maio 05, 2006

A cidade-movimento

Bem sei que o relato vem tardio... Mas a verdade é que a agitação da cidade de Londres parecer ter-se entranhado em cada uma de nós, de tal forma que o ritmo de pulsação (nas veias e nas ideias) ainda não acalmou. Ainda assim, o dever da amizade nos relatos, a memória dos afectos, ou apenas a necessidade de parar e registar emoções, fazem-me escrever. Imprimo, portanto, nas letras e sinais gráficos um fragmento do que vivi, senti e sorri.

As cores que predominam - o vermelho, o preto e o dourado - são completadas pelo tijolo em cada casa e recanto. Cidade feita de Legos homogéneos, Londres é inundada de gente a todas as horas do dia. Vistas de longe (à distância do tempo e do espaço), também as suas pessoas parecem peças de um Puzzle. Como na pintura de Monet (com que nos presenteiam na National Gallery e na Tate Modern...), vistas de perto são pinceladas que imprimem movimento à cidade, cada uma com a sua cor, suas ideias e olhares. Vistas de longe são uma amálgama de cores e traços que, juntos, formam uma cidade fantástica.
(Ainda assim, prefiro Pollack... Com as suas cores primárias, o seu jazz impresso na pintura e os seus traços que parecem dizer-nos “Vens? Danças?”.)

A cultura, que inunda a cidade por todos os lados, é surpreendentemente acessível. Falo de cultura-arte para apreciação e aprendizagem. Pintura, escultura, arte antiga e moderna. A arte que habita os museus de Londres pode ser visitada gratuitamente. Nestes, entramos e observamos, perdemo-nos com o olhar e, por vezes, com os suspiros e exclamações de surpresa e prazer a cada esquina, onde “aquele” quadro, aquela escultura se nos apresenta. Uma massagem aos sentidos é o que é.

Paradoxalmente, a cultura-produto é elitista. Também lá o Livro, a Música e o Teatro espreitam com a etiqueta de venda demasiado alta para que as pessoas-pinceladas consigam pegar-lhe. E o paradoxo surge: em todos os locais onde há gente há livros. Abertos e a serem lidos... Surpreendente.

As caminhadas, os momentos de viagem em silêncio e a observação das pessoas dão azo a ideias fabulosas de histórias e contos. É uma cidade que convida à imaginação. Que nos dá vontade de registar de alguma forma o que queremos partilhar com o mundo. Que nos diz que é possível. No entanto, o movimento não permite parar facilmente. E a ideia que surgiu no metro, aquela ideia fabulosa a registar assim que pudesse, era perdida no mar de estímulos com que era bombardeada constantemente.

E depois há as amigas... As pinceladas que tornaram tudo mais bonito. Pintei o meu quadro em Londres. Observei com os olhos da mente e do coração, escolhi as cores-sentimentos, os materiais-sentidos, e pintei com o pincel chamado memória. A minha pintura está, assim, esboçada. O tempo, as conversas, as outras viagens e tudo o mais que tenho pela frente farão o resto. Na minha galeria de imagens e momentos, quem vier verá.

Foi uma boa semana. Mas já penso na próxima...

2 comentários:

Carminho disse...

Uma aguarela fresca!
É o que o texto me evoca!
Um texto brilhantemente escrito e que foi repescar memórias muito boas de Londres...
Muito boas mesmo...
Mas, ao contrário do que dizes, eu consegui parar em Londres.
Aliás, fui para lá tão acelerada e agitada que, para mim, Londres foi um lenitivo para a alma!
Foi na Trafalgar Square, entre mistura de gentes e no meio de uma praça sobrevoada por pombos que parei e pensei na minha vida.
Que abrandei...que minimizei tanto daquilo que julgava ser do tamanho do Mundo!!
Foi parada a olhar para Mondrian que me apercebi que 3 cores podem mudar toda a uma perspectiva sobre um povo, uma época, uma mentalidade...
Em Londres caminhei imenso e nada melhor do que a caminhada e um bater de brisa de final de tarde a bater-nos no rosto para varrer todas as migalhas que era, no fundo, os meus (outrora) colossais problemas!
E acredito que esta viagem vos mudou e vos enriqueceu (quanto mais não seja pela imensa cultura que nos invade!!): tal como todas as viagens que fizemos e faremos ao longo das nossas vidas...

Adorei o teu relato.
Obrigada, amiga

Beijinhos

Unknown disse...

Obrigada.....

... muito obrigada pelo pedacinho enorme de Londres que viajou até mim através das tuas palavras!!

... muito obrigada pelo regresso a essa que é a minha segunda cidade preferida!!!

... muito obrigada porque relendo as tuas palavras conseguirei ouvir aquelas vozes (não se entranhou em ti o repetido mind the gap?), sentir aqueles odores e rever aquelas coras tão lindas daquela maravilhosa urbe.

... simplesmente obrigada!!!!