quarta-feira, julho 25, 2007

Não, não é cansaço...

Convém que leiam primeiro o outro poema para perceberem este. Digam lá se o senhor não era inteligente?



Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
E um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço por quê?
É uma sensação abstrata
Da vida concreta —
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angústia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Sim, ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...

Como quê?...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola do outro, e a voz dela!)

Porque oiço, vejo.
Confesso: é cansaço!...


Álvaro de Campos

2 comentários:

Ivana disse...

Não pares de nos trazer poesia!!
Gosto de ler por cá.

Unknown disse...

É uma sensação abstrata
Da vida concreta - Esta frase poderia traduzir o que por vezes penso quando traduzir os pedaços da minha vida em palavras!!