Por favor, Madame, tire as patas,
Por favor, as patas do seu cão
De cima da mesa, que a gerência
Agradece.
Nunca se sabe quando começa a insolência!
Que tempo este, meu Deus, uma senhora
Está sempre em perigo e o perigo
Em cada rua, em cada olhar,
Em cada sorriso ou gesto
De boa-educação!
A inspecção irónica das pernas,
Eis o que os homens sabem oferecer-nos,
Inspecção demorada e ascendente,
Acompanhada de assobios
E de sorrisos que se abrem e se fecham
Procurando uma fresta, uma fraqueza
Qualquer da nossa parte...
Mas uma senhora é uma senhora.
Só vê a malícia quem a tem.
Uma senhora passa
E ladrar é o seu dever – se tanto for preciso!
*
O pó de arroz:
Horrível!
O bâton:
Igual!
O amor de Raul é já uma saudade,
Foi sempre uma saudade...
(O escritório
Toma-lhe o tempo todo?
Desconfio que não...)
Filhos tivemos um:
Desapareceu...
E já nem sei chorar!
*
Chorar...
Como eu queria poder chorar!
Chorar encostada a uma saudade
Bem maior do que eu,
Que não fosse esta tristeza
Absurda de cada dia:
Unha
Quebrada de melancolia...
Perdi tudo, quase tudo...
Hoje,
Resta-me a devoção
E este pequeno inteligente cão.
Por favor, Madame, tire as patas,
Por favor, as patas do seu cão
De cima da mesa, que a gerência
Agradece.
Alexandre O'Neill (1924 - 1986) in "No Reino da Dinamarca" (1958)
(fica o poema, acompanhado de votos de um bom fim-de-semana que está aí...quase aí...
sejam insolentes, q.b. ;)!)
3 comentários:
Engraçado... Quando vi o título desta posta a primeira coisa que me veiu a cabeça foi as "Natinhas" que uma colega do office nos trouxe esta manhã.
Quando li o poema apenas recordei o verso que esta manhã li no livro que me acompanha na viagem de metro, e que não tem muito a ver com o poema, mas que vos deixo aqui:
"Diante de mim havia duas estradas
Eu escolhi a estrada menos percorrida
E isso Fez toda a diferença" (Robert Frost in A Bruxa de Portobello de Paulo Coelho)
A memória e as nossas recordações dão para isto.
Concordo. Sejam insolentes q.b
Ai Natinhas...
Just love natinhas, com canela...
Ai que salivo!!!
Não posso deixar de concordar: Sejam insolentes.
E também eu salivo pelas natinhas!!!
:-)
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